quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Estava escrito

Tinha uma reunião fora, às 15h.
Almocei no gabinete.
Distraí-me com as horas e saí já a queimar.
Cheguei ao estacionamento do edifício onde tinha a reunião às 14h55. Afinal ia correr bem.
Saí do carro para pegar, pelo lado do pendura, a carteira, o computador e as luvas.
Abri a porta, e vinda sabe-se lá de onde, entrou uma vespa.

Fiquei a olhar, incrédula, cabelo num novelo, por causa do vento, boca aberta de espanto, mãos a tremer de frio.
E a puta ali, desafiadora, com o seu rabo magro enfiado num fatinho de riscas amarelas e pretas, pousada no meu volante, a olhar-me de esguelha.
“E agora?”, pensei eu. “E agora??”

Não a iria matar (não seria capaz) mas não podia arriscar deixá-la fechada. O regresso ao carro só se daria já de noite e nessa altura o mais provável é que estivesse fula e me presenteasse com o seu afiado ferrão. Tendo já sido vítima de uma coisinha dessas, preferi não arriscar.

TIC-TAC
TIC-TAC

Já estava atrasada. Era oficial.

Dei a volta para abrir a porta do condutor, numa patética tentativa de a fazer perceber que não era bem-vinda. “É favor pôr-se na alheta que ninguém a convidou!”. Não disse, mas pensei, com muita força.
Mas ela nada.
Ainda com receio de fazer gestos bruscos, peguei numa luva. Era branca.
Na encenação mais patética e desadequada da expressão “bofetada de luva branca” tentei convencê-la à força de material polar que o lugar dela não era dentro daquela viatura.

Consegui. Recompus-me.

Peguei na carteira e no computador e, quando triunfante, caminhava para o edifício, quentinha por dentro, por saber que não tinha tirado a vida à criatura inocente, pisei um caracol.

Estava escrito.

 
 

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