quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Higiene social

Não há relação direta entre duas notícias que ocuparam tantos (tele)jornais nos últimos dias. No entanto apetece-me relacioná-las, numa esfera de comportamento em sociedade e nas preocupações de quem (formalmente) nos governa.

Num momento tão particular como o que estamos a viver nos últimos anos, quando há tanto para fazer na “legislação animal”, quando ainda se abatem animais perdidos, com chip, sem o cuidado de se verificar se não há uma família à procura, em desespero, faz sentido o governo lançar a questão do número de cães e de gatos por apartamento? Faz sentido chegar-se a um número concreto, ignorando tantas outras questões – as mais relevantes?
E se forem dois cães e o dono lhes bater todos os dias? E se for apenas um gato e só tiver comida uma vez por mês? E se forem três pinschers e o apartamento tiver 300 m2? E 50 hamsters numa gaiola escura e mal cheirosa, não contam?
Num país aonde ainda se torturam animais numa arena e se permite que os pais levem as crianças a assistir a esta barbaridade, faz isto algum sentido?
E que tal reunir esforços para implementar campanhas de esterilização? De adoção consciente? De penalização de quem maltrata um animal toda a sua vida? Não estará o Ministério da Agricultura e do Mar com as prioridades do avesso?
Higiene social não é ter até dois cães ou quatro gatos num apartamento. Higiene social é ter animais bem tratados, saudáveis e amados, em espaços adequados à sua quantidade e dimensão.

Higiene social não é ter casamentos de toda uma vida. Para toda a vida. Higiene social é respeitar o espaço privado de um relacionamento. Mesmo quando ele acaba. É zelar pelo bem estar das vidas que se geraram. Guardá-las com a própria vida.
Não sabemos o que se passou entre os cidadãos Bárbara e Manuel. A verdade está com eles e é possível que nem seja igual para ambos. Mas sabemos que milhares de crianças vivem expostas a situações de violência de forma continuada. Sabemos que muitas continuam expostas a ela, mesmo depois dos pais se separarem.
Porque a violência não obriga a espaço comum. Vive nas palavras e em gestos que produzem feridas mais fortes do que uma cicatriz na pele. São momentos que permanecem para sempre.
Repito: para sempre.
Não saberá o cidadão Manuel isto? Dizer em público o que disse acerca da mãe dos seus filhos – sendo ou não verdade – não tem consequências? As autoridades de direito não atuam perante afirmações que, com 100% de certeza, chegarão a estas crianças (hoje, amanhã ou daqui a 3 anos)? Fica impune um pai que tenta entrar em casa a meio da noite, acompanhado de desconhecidos e recorrendo a violência, sabendo que os filhos estão do outro lado da porta? Terá o Tribunal de Menores isto em consideração? Caramba.

Se querem regular o que se passa nos apartamentos dos portugueses, deixem lá os bichos de quatro patas e vamos primeiro tratar destes animais.


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